Prisões aumentam após ação da PM passar a focar o traficante, e não o usuário; droga lidera a lista de apreensões
Jessica Riegg
O problema referente às drogas em geral e, principalmente, o crack se agravou de três anos para cá por causa da facilidade encontrada pelos traficantes de disseminar os produtos. Antes disso, a droga não era registrada em Divinópolis, assim como em outras cidades do interior do país. Ela chegou ao Brasil na década de 80 e somente em 1990 começou a circular no Rio de Janeiro. Antes, o crime organizado não permitia a entrada do produto. Somente depois disso, passou a ser encontrada em outros estados. Atualmente, é consumida em níveis médio e alto em 70% dos municípios mineiros, conforme aponta a avaliação de prefeitos na pesquisa Observatório do Crack.
A sociedade não conseguiu acompanhar essa distribuição da droga, começando a ser alertada dos perigos apenas em 2004, quando surgiram as primeiras políticas antidrogas, começando a se embasar nos eixos da prevenção, da segurança, da pesquisa, do tratamento e da reinserção social. E não apenas nas políticas repressivas como antigamente. A sociedade começou a ficar assustada com a quantidade de usuários de drogas espalhados pelas ruas e somente aí passou a enxergar o problema de perto.
Em Divinópolis, o número de ocorrências relacionadas ao uso de drogas caiu, porque o foco da Polícia Militar vem mudando. Agora, as ações repressivas ocorrem em maior número em relação aos traficantes. Em 2010, 505 pessoas foram conduzidas à delegacia por uso de substâncias ilícitas. Em 2011, até o momento, foram 217. Em relação ao tráfico, o número passou de 355 pessoas presas e 104 apreendidas em 2010 para 307 presos e 68 apreendidos até sexta-feira (11). Ou seja, o número aumentou de uma média de 29,5 prisões por mês no ano passado, para 30,7 mensais em 2011.
As denúncias no 181 também passaram a ser mais direcionadas para locais em que há suspeita de tráfico e raras vezes para onde há consumo de drogas. Em relação à quantidade de droga apreendida, o crack lidera a lista, seguido de cocaína e maconha.
CRACK
Uma droga barata, de grande penetração social e com alto poder de causar dependência, sendo que o efeito dura dez minutos, sendo necessário que a pessoa utilize com álcool ou outro tipo de droga, seja a maconha ou o álcool de posto de gasolina, para o efeito durar mais. Essa é a droga mais temida deste século: o crack, que tira a vida de muitos jovens diariamente.
Ela é a mais temida não por ser a mais consumida, pois essa não é a realidade brasileira, mas, sim, porque agride mais a população. De acordo com o secretário-adjunto municipal de Políticas Antidrogas, Adriano Siqueira, o maior problema ainda é o álcool e a maconha, por serem a porta de entrada para uma dependência química.
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Homem esconde drogas no bueiro no centro da cidade |
Informação
Para Adriano, é preciso contar com todos os setores da cidade para tentar resolver ou pelo menos minimizar os problemas. Afinal, para ele, quando toda a sociedade se mobiliza, o problema pode ser reduzido.
- Cada um precisa fazer a sua parte para entender um pouco do problema para que até a nossa indústria possa gerar uma possibilidade de mudança - informou Adriano.
O secretário-adjunto afirmou que o primeiro passo é se informar e repassar essa informação a filhos, netos, sobrinhos e até vizinhos. Mas, para isso, é preciso primeiro informar esses formadores de opinião, através de fóruns e palestras, como as que estão sendo organizadas pela secretaria.
- Às vezes, adolescentes até ouviram falar de algum tipo, mas chega uma festa, uma balada, e parece que nunca ninguém falou nada. Eles parecem não saber que o crack prejudica a saúde, que pode levar a uma dependência muito séria e à angústia, depressão e problemas de coração. E a pessoa simplesmente, no primeiro momento, inocentemente experimenta - acrescentou Adriano.
Na opinião do secretário-adjunto, falta informação até no que se refere a bebidas e cigarros, já que a droga não é a primeira coisa que entra na vida de uma pessoa. Ele acredita que, antes de a droga chegar, a criança ou o adolescente já teve direitos violados. Assim, o uso do entorpecente acaba sendo uma consequência de toda uma vida fragmentada. Conforme indica o secretário, há pequenas coisas que podem ajudar a frear esse desencadeamento, como afeto, contato, cuidado, interesse e alertas.
Cultura de sobriedade
A droga faz parte da cultura brasileira desde 1905, quando já havia cigarros com maconha. Em seguida, foi a vez de o álcool entrar na sociedade e gerar uma cultura tão forte que já se torna normal mandar crianças comprarem bebidas alcoólicas. Adriano explica que não basta apenas lutar contra as drogas, é preciso primeiro criar uma cultura de sobriedade e retirar esses maus hábitos enraizados nos brasileiros.
Estigma
Outro grave problema que prejudica as ações contra o crack é o estigma criado dos usuários desses produtos, que são vistos muitas vezes como desocupados, malandros, que não querem trabalhar. Eles são, na maioria das vezes, tratados como “drogados” e não como dependentes químicos.
- Enquanto tiver a rotulação de “drogado”, estamos colocando a pessoa longe de sua dignidade, de sua responsabilidade, sem acesso ao acolhimento, estamos colocando-a numa condição estigmatizada. Aí teremos duas coisas para vencer, não apenas a situação da pessoa, mas também a nossa condição de pessoas que podem fazer alguma coisa e, justamente por causa do preconceito instalado, decidirá não fazer – justificou Adriano.
E esse preconceito começa com a família que sofre com um dependente químico e, na maioria das vezes, desiste nas primeiras tentativas. Isso acontece porque a família se sente despreparada e desapoiada, e não percebe que pode fazer a diferença. Os membros procuram um caminho para vencer, mas o mais fácil é sempre passar por cima dele, ou simplesmente excluir o dependente da vida.
Isso porque o tratamento é demorado, já que o dependente, na maior parte das vezes, usa não somente o crack, como também o álcool e a maconha.
Qualidade de vida nas escolas
Para ensinar crianças e adolescentes a terem amor pela vida e, assim, recusarem qualquer oferta de bebidas ou drogas, Divinópolis implantará no ano que vem o Programa de Qualidade de Vida Amor Exigente – PQVAE –, que vem funcionando em São Paulo com ótimos resultados. O objetivo macro é interferir numa mudança de cultura para começar a tão importante sensibilização contra o crack e as drogas como um todo. Mais importante ainda é a criação de uma cultura de acolhimento.
- Por que o usuário de drogas fica na rua tanto tempo? Para ficar perto da droga, porque o crack só faz efeito por dez minutos, ou seja, ele é escravo de uma pedra e não tem para onde ir - frisou.
Na visão de Adriano, muitas vezes, a última opção da pessoa seja usar a droga para ser feliz. Mas, quando há um acolhimento e um bom tratamento, o olhar da população muda e, assim, o dependente ganha mais força para buscar outras alternativas de felicidade.
Políticas públicas
Já existem diversos programas de combate às drogas na Polícia Militar que funcionam como um alerta para as famílias e, principalmente, para os jovens. O mais conhecido é o Programa de Erradicação às Drogas – Proerd –, que ensina a dizer não desde o oferecimento de bebidas alcoólicas. Essa ação é acompanhada ainda pela Patrulha Escolar, Novo Rumo, Arte e Vida, e constantes palestras realizadas no Quartel.
- Realizamos essas ações para informar sobre os perigos dessas drogas e de que forma a criança pode se proteger delas - informou o comandante do 23o Batalhão da Polícia Militar, tenente-coronel Júlio Teodoro dos Santos.
Há ainda ações repreensivas de busca e apreensão, mas o comandante acredita que elas só serão verdadeiramente eficazes quando o usuário perceber que o tratamento é a melhor opção.
Para ajudar nessas ações, estão começando a ser implantadas políticas públicas contra as drogas, desde a criação da secretaria, em março deste ano. As primeiras ações são aprovar uma lei municipal que amplie o crédito na secretaria, para que possam ser efetivados alguns planos, e ainda elaborar um diagnóstico completo das 12 comunidades terapêuticas de Divinópolis. Esse estudo começa a ser realizado nesta semana, com o apoio da Funedi UEMG. Tendo em mãos esse relatório, será possível criar modos de interferir nas internações e ajudar na renda desses locais.
- Prevenção é a pessoa ter aonde ir, tratamento é manter as portas abertas - lembra Adriano. Por isso, ele acredita ser tão importante esse diagnóstico, para que o tratamento seja facilitado.
- Nessa luta contra as drogas, nada sozinho é eficaz - finalizou Adriano.